O Nordeste concentra os quatro estados com as piores remunerações para os trabalhadores negros do país. Segundo levantamento realizado pela Agência Tatu, com base nos dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2024, Paraíba, Piauí, Alagoas e Rio Grande do Norte pagam em média R$ 2.321 para pretos e pardos, enquanto trabalhadores brancos recebem em média R$ 3.161 nesses estados, uma diferença de 36%.
Essa diferença salarial é observada em todos os estados brasileiros. No país, profissionais negros recebem em média R$ 3.075, enquanto trabalhadores brancos ganham R$ 4.496, 46% de diferença.
Veja ranking de remuneração de trabalhadores nas UFs brasileiras:
O Distrito Federal lidera a disparidade de remunerações com brancos tendo salários 86,99% mais altos que pretos e pardos. Em seguida vem o Rio de Janeiro, com uma diferença de 49,85%, e a Bahia, com uma diferença salarial de 46,31%.
Esses dados são baseados nas declarações anuais prestadas pelos empregadores sobre seus contratados. Calculados pela média de todos os valores salariais existentes nas categorias de emprego, o gráfico ilustra essa desigualdade estado a estado, evidenciando a distância que separa a renda entre os grupos raciais em todo o território nacional.
Os dados mostram que essa diferença salarial persiste mesmo em cargos com altas remunerações, como postos de chefia e alto escalão. Negros nessas funções ganham, em média, R$ 7.144, contra R$ 12.319 recebidos por brancos. Essa diferença de 72% é a maior observada entre as categorias, sendo uma realidade presente em todas as profissões.
Disparidade salarial e construção social
Para Marli Araújo, doutora em Serviço Social e professora da Universidade Federal de Alagoas (UFAL), a baixa remuneração no Nordeste e desigualdades salariais é profunda, pois existe um estigma de atraso atribuído ao Nordeste, além de possuir uma população majoritariamente negra, e essa construção social reflete diretamente nos indicadores econômicos.
Em um âmbito geral, segundo a especialista, para entender as diferenças salariais entre pessoas negras e pessoas brancas, é preciso entender como se forma a classe trabalhadora brasileira no pós-abolição e como isso implica em termos salariais atuais.
“Você tem uma população de 700 a 800 mil pessoas libertas após a escravidão e você tem uma sociedade brasileira que se forma a partir desse capitalismo industrial da Inglaterra. Essa população negra não é entendida como classe trabalhadora, porque existe uma construção política, ideológica, social, que negro é preguiçoso, que pessoas negras não gostam de trabalhar. Então, você tem aí um processo migratório eugenista no início do século XIX. E, com isso, você vai ter uma diferenciação entre trabalhadores brancos e trabalhadores negros a partir de uma questão racial e que se implica no lucro capitalista”.

Já para o ativista antirracista Jeamerson dos Santos, pesquisador dos campos de educação, cultura e arte, o Nordeste tem uma questão política e econômica histórica, que influência na disparidade salarial. “Há uma colonialidade muito grande nas relações de poder, isso também mantém a região Nordeste dentro dessa condição triste e vergonhosa de ser uma região com índices de desenvolvimento econômico para a população negra de piores condições”.

Caminhos para equiparação econômica
Ele ainda explica que a equiparação salarial só será possível através do enfrentamento desse contexto histórico e social. “Essas pessoas, por exemplo, que estão no mercado de trabalho, precisam ter apoio para isso, e é necessário que o Estado brasileiro assuma a responsabilidade efetiva de enfrentar o racismo estrutural”.
O especialista ressalta que essas mudanças devem avançar em direção a uma sociedade mais equitativa, indo além da simples discussão e focando em ações concretas. “É importante entender que essa reparação ou equiparação econômica vai se dar quando a gente entender que as contribuições negras não são empecilhos para o desenvolvimento do Brasil, pelo contrário, elas são potências e sempre foram potências, dentro das suas singularidades, dentro das suas pluralidades, dentro das suas diversidades”, conclui.









