É manipulado com ferramentas de inteligência artificial o vídeo que sugere que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) estava sob o efeito de álcool durante o encontro do G7, realizado no Canadá em junho de 2025. O conteúdo, publicado no Instagram com trilha sonora irônica e distorções visuais, foi criado para insinuar que o presidente cambaleava e se comportava de forma inadequada diante de outros líderes mundiais.
O Comprova verificou a utilização de IA no vídeo através da plataforma Hive Moderation, que concluiu que o vídeo possui 99,9% de chance de ter sido criado artificialmente. Essas ferramentas, porém, não são infalíveis: elas indicam probabilidades, não certezas, e devem ser usadas como apoio, junto a outras evidências de verificação.
No conteúdo em questão, há várias evidências que deixam clara a manipulação. A imagem apresenta distorções típicas de conteúdos gerados por IA. Um exemplo claro ocorre no momento em que Lula abraça o presidente ucraniano Volodimir Zelenski: os dedos de suas mãos aparecem fundidos. Além disso, os óculos do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, desaparecem e aparecem desfigurados em determinados trechos da gravação.
A postagem usa como única fonte o próprio vídeo manipulado, acompanhado da música “Marvada Pinga”, que reforça a falsa narrativa de embriaguez. Embora a legenda da postagem informe que se trata de um conteúdo gerado por inteligência artificial, muitos usuários comentaram como se o vídeo fosse real.
A cena faz parte de um momento de distração durante a tradicional foto oficial da cúpula. Lula conversava com o presidente do Conselho Europeu, António Costa, tendo ao lado a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, enquanto os líderes se posicionavam para o registro. Ao ser alertado pelos demais participantes, Lula retomou sua posição para a fotografia, sem nenhum comportamento inusitado ou fora do protocolo diplomático.
Quem criou o conteúdo investigado pelo Comprova
O vídeo analisado foi publicado por um perfil do Instagram que conta com 161 mil seguidores. A página tem como prática comum o uso de inteligência artificial para ironizar e atacar figuras públicas associadas à esquerda, especialmente Lula. Em sua bio, o perfil divulga uma chave Pix para doações e utiliza uma seta com as cores da bandeira do Brasil como imagem de perfil.
A recorrência de conteúdos manipulados com o mesmo tema – geralmente associando Lula ao consumo de álcool ou a comportamentos constrangedores – indica uma estratégia sistemática de desinformação voltada para reforçar estigmas e alimentar a polarização política.
O perfil não utiliza fontes confiáveis para embasar as alegações apresentadas nos vídeos e não deixa claro que o conteúdo publicado tem caráter humorístico ou satírico. Apesar de criar imagens e cenas absurdas, o autor das postagens não admite de forma transparente que se trata de uma produção voltada ao entretenimento. Em vez disso, o conteúdo é divulgado sem contextualização, o que pode induzir parte do público a interpretá-lo como verdadeiro. Essa ambiguidade favorece a disseminação de desinformação, especialmente em temas politicamente sensíveis.
O Comprova entrou em contato com o perfil por meio do Instagram, mas não obteve retorno até a publicação desta verificação.
Por que as pessoas podem ter acreditado
A publicação utiliza uma combinação de elementos visuais, trilha sonora e contexto político para criar uma narrativa enganosa. O vídeo mostra o presidente Lula em interações constrangedoras com outros líderes mundiais durante o G7, enquanto a música “Marvada Pinga” toca ao fundo — o que reforça a insinuação de que ele estaria embriagado. Esse recurso sonoro funciona como uma sugestão indireta, mas poderosa, que molda a interpretação do público sem precisar de uma afirmação explícita.
Embora a descrição do vídeo indique que ele foi gerado por inteligência artificial, o aviso aparece de forma sutil e pode passar despercebido por usuários desatentos ou com menor familiaridade com esse tipo de tecnologia. A ausência de uma sinalização clara de que se trata de uma peça de humor ou ficção colabora para a ambiguidade da postagem.
Além disso, a publicação explora estereótipos e críticas recorrentes ao presidente, o que pode ativar crenças pré-existentes e gerar uma aceitação automática do conteúdo por parte de quem já tem posicionamento político contrário. A combinação de elementos visuais realistas e ausência de fontes verdadeiras cria uma aparência de verossimilhança que pode confundir o espectador e levá-lo a acreditar que os eventos retratados realmente aconteceram.
Fontes que consultamos: O Comprova utilizou a ferramenta Hive Moderation. Também foram consultados o portal jornalístico Poder360, e o vídeo original publicado pelo canal canadense Global News.
Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas, eleições e golpes virtuais e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: Outras checagens sobre o tema: A investigação do vídeo viral também foi realizada pelo Aos Fatos, Reuters e Estadão Verifica. Além disso, o uso de IA tem sido cada vez mais recorrente nos conteúdos de desinformação. O Comprova verificou, recentemente, por exemplo, que vídeos virais de escultura de areia de Bolsonaro foram gerados com a ferramenta.